Embrapa desenvolve tecnologia capaz de eliminar patógenos comuns da mandioca, usando apenas temperatura e umidade controladas.
A busca por métodos inovadores que impulsionem a produtividade e a qualidade na agricultura é constante. Nesse cenário, a termoterapia da mandioca emerge como uma técnica promissora, capaz de eliminar patógenos e garantir a produção de manivas mais saudáveis e, consequentemente, mais produtivas. O engenheiro agrônomo Helton Fleck, analista da Embrapa Fruticultura e Mandioca, apresentou detalhes sobre este processo durante a Show Rural Coopavel 2025, despertando o interesse de produtores de todos os portes.
O desafio das doenças sistêmicas e a solução da termoterapia
A mandioca, Manihot esculenta Crantz, é um alimento básico para milhões de pessoas em todo o mundo, especialmente em países em desenvolvimento. Suas raízes tuberosas são utilizadas na indústria para a produção de amido, farinha, etanol e biopolímeros. No entanto, a ocorrência de doenças, como o complexo couro de sapo (CFSD) e os vírus do mosaico das nervuras (CsVMV) e mosaico comum (CsCMV), limitam a produção da cultura. O complexo couro de sapo, por exemplo, causa sulcos e lábios nas raízes, tornando-as fibrosas e diminuindo seu diâmetro. Já os vírus do mosaico causam clorose nas folhas e outros sintomas que prejudicam o desenvolvimento da planta.

A propagação da mandioca é feita de forma vegetativa, utilizando-se partes do caule, as populares manivas ou ramas. Essa prática, apesar de comum, pode levar à acumulação de patógenos ao longo das gerações, comprometendo a qualidade fitossanitária das manivas. Doenças sistêmicas, como as causadas por fitoplasmas e vírus, podem reduzir o rendimento das raízes em até 40%.
Nesse contexto, a termoterapia surge como uma solução eficaz. O tratamento térmico em câmara automatizada consiste em cultivar plantas infectadas em temperaturas elevadas para reduzir a replicação de vírus e fitoplasmas, interrompendo a síntese de ácido nucleico. A técnica usa uma câmara térmica automatizada que mantém as plantas em condições controladas de temperatura e umidade, promovendo a limpeza de patógenos sistêmicos. O controle da temperatura é feito por um sistema combinado de irrigação e ventilação. A câmara possui um sistema de nebulização para resfriar o ambiente e válvulas que se abrem ou fecham automaticamente conforme a variação da temperatura. A temperatura ideal para abertura e fechamento das válvulas é de 55°C e 50°C, respectivamente, e a umidade é mantida em torno de 65%.
Simples, eficaz e acessível

Uma das grandes vantagens da termoterapia é sua aplicabilidade, inclusive para a agricultura familiar. Ao contrário de outras técnicas de limpeza de genótipos, como o cultivo de meristemas in vitro, que exigem mão de obra especializada e equipamentos de laboratório, a câmara térmica pode ser construída com materiais acessíveis, como madeira, bambu ou aço galvanizado. O plástico transparente, que reveste a estrutura, também é de baixo custo e fácil de encontrar.
“A termoterapia é uma alternativa acessível ao produtor de mudas, desde a montagem até o manejo, e possibilita produção em larga escala de material propagativo (manivas), utilizando pouco espaço da propriedade“, afirma o analista Helton Fleck.
Como funciona na prática?
O processo de termoterapia envolve dois ciclos de cultivo distintos:
Primeiro Ciclo: Manivas infectadas são plantadas em leiras (camalhões) de areia e vermiculita, em proporção de 3:1. As plantas são mantidas na câmara térmica por cerca de 60 dias, onde a temperatura e a umidade são controladas. O calor reduz a carga viral e elimina os fitoplasmas, permitindo o desenvolvimento de células saudáveis.
Segundo Ciclo: As hastes das plantas são cortadas em fragmentos de 15 cm, contendo três gemas, e desinfetadas com amônia quaternária. Esses fragmentos são plantados em novas leiras, com espaçamento adequado, e submetidos novamente ao tratamento térmico.
Obtenção de Mudas: Após mais 60 dias, as miniestacas são cortadas, desinfetadas e plantadas em sacos plásticos com substrato adequado, para posterior plantio em campo.
O sistema de irrigação da câmara térmica inclui nebulizadores, tubos de PVC e um injetor de Venturi para adição de fertilizantes. A câmara também possui um sistema de controle automatizado que monitora e ajusta as condições de temperatura e umidade. Um pedilúvio com cal virgem ou amônia quaternária na entrada da câmara e a limpeza de todas as ferramentas e materiais cortantes com amônia quaternária são medidas de segurança para evitar a reinfecção das plantas.
Resultados e Benefícios
A termoterapia não apenas limpa as plantas de patógenos, mas também acelera a multiplicação de mudas. Enquanto no método tradicional, uma haste de 1 metro rende apenas 5 manivas em um ano, na câmara térmica, a mesma haste pode gerar 250 mudas em seis meses. Além disso, as manivas produzidas em câmara térmica têm qualidade fitossanitária superior às obtidas em campo.
“Esse método de termoterapia também é um método muito interessante de multiplicação de manivas, uma vez que proporciona um grande número de mudas por planta, quando comparado ao método tradicional. Uma proporção de 4×1“, ressalta Fleck.
Termoterapia: Um futuro mais produtivo para a mandiocultura
A termoterapia da mandioca, com sua simplicidade e eficácia, representa um avanço significativo na produção de manivas saudáveis. Ao adotar essa tecnologia, os agricultores familiares podem garantir a qualidade de seu material de plantio, reduzir perdas e aumentar a produtividade de suas lavouras. Vale destacar também o papel da Rede Reniva (Rede de multiplicação e transferência de manivas semente de mandioca com qualidade genética e fitossanitária), que atua como uma ponte entre a pesquisa e o campo.
Ao promover a multiplicação e a transferência não só desta tecologia, mas também de manivas-semente de mandioca com qualidade genética e fitossanitária, a Reniva garante que os agricultores familiares tenham acesso a materiais de plantio saudáveis e produtivos. Essa iniciativa, que nasceu a partir do trabalho da Embrapa Mandioca e Fruticultura, visa preencher a lacuna da falta de material propagativo de mandioca, especialmente nas regiões Norte e Nordeste do Brasil.
A rede não apenas disponibiliza variedades melhoradas, resistentes a doenças e altamente produtivas, mas também permite que os produtores multipliquem seus próprios genótipos adaptados às suas regiões, assegurando a sustentabilidade e a competitividade da cultura. Ao integrar a tecnologia da termoterapia com a distribuição de manivas de qualidade, a Reniva fortalece a agricultura familiar, proporcionando segurança alimentar e renda para milhares de famílias.
Para saber mais detalhes sobre a montagem e o manejo da câmara térmica automatizada, baixe agora mesmo o guia técnico completo, elaborado pela Embrapa Mandioca e Fruticultura. Link abaixo:
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